"Music for a vast, half-submerged, ruined cathedral. Walls overgrown. Birds wheeling under the broken dome. Only possible to enter by swimming underwater through a huge warm blue lake. Of course you would be able to breathe the water. Music would be moving quietly through the walls. Almost imperceptible unless you focus on it. Slowly but constantly changing."
John Foxx in "Cathedral Oceans"
Dia#13
Por vezes, quando estou sozinho a pintar num espaço imenso como uma biblioteca ou colégio, sou acometido por um profundo sentimento de religiosidade. Não falo obviamente de religião no sentido mais tendencioso da palavra. Falo sim de um sentimento de espiritualidade e paz interior onde o tempo e o espaço parecem dissolver-se. Nesses momentos, entro num estado alterado de consciência em que me fundo totalmente no mundo que estou a criar e na música que estou a ouvir. O tempo, o cansaço, a fome, os pincéis e as tintas deixam de ter existência própria. Nesses momentos de epifania sinto que estou a fazer aquilo para o qual nasci, a percorrer o caminho que me está destinado desde sempre. Nesses momentos consigo ouvir o som do mecanismo invisível que gere a minha vida desde tempos imemoriais. Tudo está no lugar certo, no momento certo. Nesses momentos sinto que finalmente estou a regressar à Casa-dentro-de-mim onde sempre vivi, e pressinto que essa Casa é uma Catedral.
E foi imerso neste oceano de paz, com os sentidos aninhados nos sons contemplativos de John Foxx com a sua impressionante trilogia "Cathedral Oceans", que dei início à pintura do caule do cogumelo e dos sapatos da personagem (continuam abertas as sugestões para o futuro nome). A um nível mais subtil, aprimorei as sombras da tiara silvestre, da gargantilha citrinica e das páginas folheadas. Envelheci dos cantos de metal do livro e terminei o interior da sua lombada. Pincel, lápis de cera, grafite, tesoura e as pontas dos 10 dedos (que ficaram sem impressões digitais e cheios de bolhas).
Perto da biblioteca existia uma imensa árvore que foi cortada em vários discos com aproximadamente 40 cm de altura. Não consigo vislumbrar o que pode levar ao corte de um ser tão belo e imponente. Talvez estivesse doente, talvez fosse "demasiado grande" para o ambiente urbano, ou talvez fosse um "incómodo" no passeio onde se encontrava. Juntei as forças que me restavam e guardei dois pedaços de tronco no porta-bagagens do carro. Juntos, vão dar um maravilhoso trono para os contadores de histórias que vierem colorir ainda mais este espaço.
Paulo Galindro
1 comentário:
O trabalho está extraordinário. Conseguiu transformar uma horrivel parede numa obra de arte. Estou mesmo impressionada. Parabéns!
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