Acabei agora mesmo de ler o livro
“Índice Médio de Felicidade”, do meu amigo
David Machado. Comecei a lê-lo na segunda-feira, nos transportes públicos, onde passo 4 horas por dia da minha vida. Não sabia o que esperar. Apenas que seria uma experiência muito boa. Outra coisa não poderia esperar do talento do David.
Talvez porque sinta um vazio dentro de mim, uma fome de algo que me indique um caminho. Uma fome de luz, no meio da escuridão em que todos fomos lançados. Talvez porque cada vez mais sinta necessidade de acredita que no final tudo ficará bem. E se tudo não está bem, é porque ainda não acabou. Movido por esta ânsia, e inspirado pelo amarelo da capa, pelo título sugestivo, e pela imagem idílica de uma carrinha amarela - que me traz à mente imagens sempre boas de mar, de sol e de surf - decidi subverter a ordem dos livros que se amontam na minha mesa-de-cabeceira, que entenda-se, é sempre da mais antiga aquisição para a mais atual. E este livro estava no fim da pilha, logo a seguir ao Mítico “Livro do Desassossego” de Fernando Pessoa, e a um monte de livros de Luís Sepúlveda.
Mas não foram só os aspectos estéticos do livro que contaram na equação. Como não poderia deixar de a intuição também contou, e muito. Não sou uma pessoa tipicamente otimista. Numa escala de Pessimismo / Otimismo de -5 a 5, eu ficar-me-ía pelo.... -1. O facto de o personagem deste livro estar imbuído de um otimismo à prova de bala foi por isso também determinante para subverter o pequeno mundo literário da minha mesa de cabeceira.
Desenganem-se desde já… este é um daqueles livros que não pode ser avaliado de ânimo leve pelo invólucro, vulgo capa. Esse desporto, a que por vezes eu também gosto de praticar, não pode ser aplicado de forma tão linear aqui. E ainda bem. Este livro é negro, denso, por vezes insuportavelmente triste, como são negros, densos e tristes os dias em que vivemos. O contraste com a capa não podia ser mais brutal, irónico, e no entanto, tão lógico. Porque a Luz e a Escuridão não vivem um sem o outro. A falta de um aniquila imediatamente o outro. E uma mancha negra é muito mais negra quando rodeada de um mar de branco, numa operação aritmética onde é aplicável a lei da comutatividade da adição. Ou seja, o contrário também é verdade.
Nas suas páginas, somos atirados para o dia a dia de alguém, cujo mundo, lentamente e de forma quase cruel, se vai desmoronando. E digo-vos uma coisa… não é um processo fácil de se ler. Por vezes marejam-se-nos os olhos. Por vezes irritam-se-nos os nervos. Por vezes enternece-nos o coração. E ao fim e ao cabo, esta é uma ruína iminente que a todos nos ameaça, neste pobre país abandonado ao demónio do dinheiro e dessa figura abstrata chamada Mercado. É exatamente aí que reside o poder deste livro… na facilidade com que encarnamos os personagens. Nos tempos que correm, esta é uma história de sobrevivência e de redenção na qual qualquer um de nós poderia ser o personagem principal (á exceção de 1% de eleitos, mas isto eu não precisava de dizer).
"E pur si muove!". "E no, entanto, ela move-se!", disse Galileu quando foi obrigado pela igreja a abdicar das suas ideias heliocêntricas. A vida continua, move-se. Enquanto tudo neste livro se vai tornando escuro e desesperançado, quando tudo parece encolher e afunilar em direção a um fim trágico, lâminas de luz cortam aqui e ali as nuvens que se vão adensando sobre as suas páginas, e nos fazem pressentir e desejar que algures lá em cima, brilhe um imenso sol radiante que mais cedo ou mais tarde tudo iluminará.
Se o Sol irá aparecer ou não?… bom… esse é um daqueles segredos que não irei revelar. Terão de ler o livro.
Na minha escala de valores, de 0 a 10, um 8,5 ficará muito bem a este livro. E não vou dizer qual é o meu ÍMF… terei de pensar melhor sobre o assunto.